OS MEUS POETAS FAVORITOS

ANTONIO GEDEÃO


   Lágrima de Preta

     Encontrei uma preta
     que estava a chorar,
     pedi-lhe uma lágrima 
     para a analisar.

     Recolhi a lágrima
     com todo o cuidado
     num tubo de ensaio
     bem esterilizado.

     Olhei-a de um lado,
     do outro e de frente:
     tinha um ar de gota
     muito transparente.

     Mandei vir os ácidos,
     as bases e os sais,
     as drogas usadas
     em casos que tais.

     Ensaiei a frio,
     experimentei ao lume,
     de todas as vezes
     deu-me o que é costume:

     nem sinais de negro,
     nem vestígios de ódio.
     Agua (quase tudo)
     e cloreto de sódio.

    in "Máquina de Fogo", 1961


Antonio Gedeão, a quem muito devo, tanto como poeta como na sua personna de Romulo de Carvalho, continua activo, agnostico inamovivel, e afectuoso como sempre, por ocasião do seu 90o aniversario. Ao meu professor de fisica no Liceu Pedro Nunes, ao nosso querido poeta, e como parte da homenagem em curso neste espaço virtual que é a www, aqui fica um testemunho simples da marca indelével que continua a traçar nas Pedras ao seu alcance. Bem haja.


pfa@mit.edu

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